quinta-feira, 23 de fevereiro de 2012

Sobre Carnaval e Casamento

Estive ausente durante o feriado de carnaval; aliás, todo o Brasil esteve ausente neste período. Por alguns dias, o país parou de se preocupar com seus problemas reais para viver a fantasia de uma festa conhecida como o "maior espetáculo da Terra". A fanfarra dos brasileiros ofusca os males sofridos durante o resto do ano e as únicas preocupações do povo são decidir qual o melhor lugar para curtir a folia ou torcer pela vitória de sua escola de samba preferida.

Sim, estou um pouco ranzinza hoje. Talvez pelo fato de não ter compartilhado da euforia do país, por ter passado um feriado absolutamente comum, sem brilho ou fato que mereça destaque. Meu feriado foi sóbrio e consciente; me cansei de ver as mesmas imagens na TV, reprisando dezenas de vezes os desfiles das escolas de samba, a folia do Nordeste, trios elétricos, festa, bebedeira e muita, muita irresponsabilidade. A ressaca deste carnaval terá um gosto amargo para muita gente, que sofreu perdas irreparáveis, em acidentes, assaltos, assassinatos e outras tristezas. Melhor seguir o bonde e ligar a vida outra vez.

Mudando de assunto, no dia 20 completei seis anos de união com meu esposo, Daniel. E logo cedo, enquanto organizava minhas ideias para este post, um amigo fez o seguinte comentário sobre os preparativos de seu casamento: "Se eu soubesse que dava tanto trabalho, teria desistido antes." Como resposta, eu disse: "Amigo, o casamento é um mal necessário."

Agora, refletindo sobre este diálogo, penso na complexidade do tema. Ele está penando com a organização dos rituais matrimoniais (convites, cerimônia, terno, bufê, som, festa...) e tudo mais que envolve este acontecimento marcante na vida de um casal.  Mas, senhores, esta talvez seja a parte mais simples e fácil. Porque o casamento é, antes de tudo, um exercício de aceitação e paciência. Muita, muita, paciência. Depois que acaba a festa e a "lua de mel", aí, sim, a coisa se torna complicada de verdade.

Minhas palavras podem soar como ressentimento, porque não passei pelos rituais e, oficialmente, meu estado civil ainda é solteira. Entretanto, há sete anos atrás eu não tinha a menor intenção de me casar. Pior, eu não suportava a ideia de viver na condição de esposa, mãe de família, dona de casa, etc. O sonho de noiva nunca fez parte da minha vida. Eu queria ser independente, bem sucedida, viajar, viver grandes e intensas experiências, ser a senhora absoluta da minha vida. Por isso, sempre desprezei as palavras melosas e a pieguice dos casais apaixonados.

Mas o "destino" se encarregou de me confrontar com este mal irremediável e necessário. Fui abduzida do meu mundo feminista para conhecer os mistérios da vida conjugal.

O processo foi rápido e totalmente inesperado. Em menos de um ano eu namorei, fiquei noiva - sim, faríamos tudo conforme manda o figurino - e, da noite pro dia estava dividindo um apartamento (e a minha vida) com uma outra pessoa. Não, não foi uma daquelas paixões avassaladoras que nos cegam e fazem perder o juízo. Posso afirmar que a nossa história aconteceu realmente por um acaso do destino. Simplesmente, o enredo foi se desenvolvendo sem que eu tivesse muito tempo para pensar nas consequências.

Como eu disse, casar requer muita paciência, dedicação e aceitação, até mais do que o amor. Porque não é nada fácil dividir a vida com alguém cujos valores, convicções, cultura e vivências são completamente diferentes dos nossos, portanto, o conflito é inevitável. Uma amiga costuma dizer que o casamento é algo terrível e que os casais jamais deveriam morar juntos. Ela defende a teoria do "cada um na sua", casamento liberal, onde o homem e a mulher fazem o que der na telha e eventualmente namoram, voltando para suas respectivas casas depois, porque morar junto é detestável.  

Concordo que dividir o mesmo teto não é fácil. Mas, na minha opinião, há muitas outras dificuldades maiores do que esta. Talvez a maior seja aceitar que o outro não é igual a você e, por isso, muitas vezes, ele não quer fazer as mesmas coisas, não consegue sentir as suas dores, sofrer suas angústias, se alegrar com a sua felicidade ou sonhar os mesmos sonhos.

Para um relacionamento dar certo, há que se ter uma boa dose de generosidade e empatia entre o casal. Porque se colocar no lugar do outro é muito, muito difícil, principalmente neste tempo em que as pessoas tendem a se preocupar exclusivamente com o próprio umbigo. E os defeitos, ignorados no período de namoro, tornam-se exponencialmente maiores com a convivência do dia-a-dia. Como diz uma tia minha: "O amor é cego, mas o casamento usa óculos de grau."

Falando desse jeito, até parece que meu casamento é um desastre; mas é o contrário! Nestes seis anos de convivência, estou aprendendo que não sou o centro do universo, que devo ponderar, ser menos intransigente e mais flexível. Aprendi a ouvir a opinião do meu parceiro e a respeitá-lo como indivíduo. Estou aprendendo a absorver o que existe de bom nele, equilibrando nossas qualidades e defeitos.

Também acredito que eu tenha aprendido a amar de verdade; porque o amor não nasce repentinamente, como a paixão. O amor se constrói na convivência e na superação das dificuldades. É claro que algumas características são mais difíceis (quase impossíveis) de aceitar, mas vamos nos adaptando, principalmente quando se respeita e admira o outro.  E, principalmente, a partir da nossa união, estamos construindo uma família, geramos um filho lindo que amamos incondicionalmente.

Mesmo sem cerimônia, festa e lua de mel, posso dizer que sou muito feliz nesta condição de esposa. Encontrei uma pessoa íntegra, leal, fiel e persistente, até porque conviver com Jacqueline Sudário não é tarefa fácil e, pelo menos por enquanto, ele não desistiu. Divergimos e discutimos muitas vezes, mas permanecemos juntos, respeitando um ao outro.

Por isso, casar é um mal necessário. Dando espaço à pieguice (vejam como o casamento muda uma pessoa!), talvez eu não tivesse me tornado quem sou sem passar por esse processo todo. Além disso, é muito bom ter um companheiro de vida, para crescer e envelher junto conosco.

E, como escreveu o poeta Vinícius de Moraes, "que seja infinito enquanto dure". Ou até que a morte nos separe, se o destino assim o desejar.